Brasil

Barão de Cocais: Movimento pelas Serras e Águas de Minas pede providências ao Ministério Público Federal

Enquanto prefeitos se mobilizam para garantir a permanência da atividade minerária em seus municípios, as populações vivem o terror gerado pelo modelo de mineração. A gravidade da situação das barragens de rejeitos em Minas Gerais não é uma preocupação recente para muitos dos ambientalistas mineiros. Diante do grave cenário vivido pela população de Barão de Cocais, em Minas Gerais, mais uma vez responsabilidade da empresa Vale, com o risco iminente da queda do talude e, com isso, o possível rompimento da barragem Sul Sudeste da mina Gongo Soco, a coordenadora do Movimento pelas Serras e Águas de Minas, MovSAM, Maria Teresa Corujo solicitou providências ao Ministério Público Federal na sexta-feira, 17 de maio de 2019. No comunicado enviado ao MPF, Maria Teresa detalha as diversas tentativas de alertar quanto aos riscos vividos pelas populações relacionados às barragens de rejeitos em anos anteriores.

Em 28 de agosto de 2018, foi enviado um ofício à Procuradora Geral da República, Raquel Dodge, e à 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal. Nele, ela fez um “apelo urgente à cúpula do MPF no sentido de reforçar a atuação desse órgão em Minas Gerais, em especial da 4ª e 6ª Câmaras, sob  risco de graves situações nas bacias dos rios São Francisco e Doce, de colapso no abastecimento de água na RMBH, Bacia do Rio Santo Antônio e Norte de Minas e de perdas irreparáveis, similares ou maiores que as oriundas do rompimento da barragem de rejeitos do Fundão em 5 de novembro de 2015.”

Alertas sem respostas

Ela conta que não obteve qualquer retorno após as denúncias e nem tomou conhecimento de qualquer ação do MPF nesse sentido. Mais de um ano antes, em 17 de março de 2017, integrantes dos movimentos ambientais já tinham se reunido com dois membros do GT Mineração do MPF a partir de requerimento para uma reunião em Belo Horizonte, mais precisamente para informar e alertar sobre a gravidade da situação da mineração em Minas Gerais, em especial em relação a barragens de rejeitos. “Após essa reunião nunca fomos informados de quais encaminhamentos foram adotados”, revela.

No dia 25 de janeiro deste ano ocorreu o rompimento em Brumadinho, na mina de responsabilidade da empresa Vale, e a ambientalista se sente perplexa por estar novamente diante de mais uma tragédia anunciada promovida pela mesma empresa. “Não há palavras suficientes para informar nesta mensagem a magnitude do sofrimento e terror dos moradores das localidades sob ameaça e da preocupação, angústia e indignação de cidadãos como eu que vêm atuando há anos em defesa de territórios frente à mineração, ainda mais diante do descompasso com a realidade e da ineficácia das autoridades que têm o dever de atuar em prol da coletividade e do meio ambiente e garantir os direitos constitucionais, entre os quais o de viver”, escreveu Maria Teresa Corujo na mensagem ao Ministério Público Federal.

Situação em Barão de Cocais

A preocupação da ambientalista está estampada nas capas de jornais dos últimos dias. De acordo com o geógrafo Rodrigo Lemos, integrante do Gabinete de Crise – Sociedade Civil, “o talude está com deslocamento expressivo e ao que tudo indica não há forma de contenção possível, ou seja, ele irá romper e cair na cava de mineração. A consequência é que a energia da queda desse volume de terra em uma cava com um acúmulo de água pode gerar uma “onda” e um impacto de energia que pode significar um forte distúrbio para a barragem que se encontra no mesmo nível, a barragem Sul Sudeste da mina Gongo Soco, e que já está comprometida”. Nesse caso, segundo Rodrigo, a contenção da barragem pode não resistir. “O rompimento do talude é iminente, mas não necessariamente o rompimento da barragem. Mas o risco é real e elevado”, avalia.

O Movimento pelas Serras e Águas de Minas, o Projeto Manuelzão, dentre outros movimentos, compõem o Gabinete de Crise – Sociedade Civil que foi criado em fevereiro de 2019 para monitorar desdobramentos e reivindicar segurança e defesa de direitos após o crime da Vale em Brumadinho.

Fuente: https://barragensalerta.wordpress.com/2019/05/18/movimento-pelas-serras-e-aguas-de-minas-pede-providencias-ao-ministerio-publico-federal/?fbclid=IwAR3z6IwyNXYryupJH2gAB9K1joBTh76ZcDXNm6lj2pB0Qpw89r-ER8wD7mI

 

 

 

Brasil

O casamento que devastou Minas Gerais

Tragédias de Mariana e Brumadinho não foram acaso. Grandes empresas de mineração financiaram políticos — de quase todos os partidos — que afrouxaram a fiscalização de barragens mineiras. Em abril de 2013, uma elegante festa de núpcias expressou esta promiscuidade.

Já é final de festa. Convidados comem docinhos – beijinho e mini mousse de maracujá – quando o pai da noiva sobe ao palco e dá uma canja acompanhado pela banda. Os políticos e empresários mais poderosos de Minas Gerais deixam as taças de lado para aplaudir o anfitrião e cantor amador, José Fernando Coura, que em abril de 2013, quando celebrou o casamento da filha Luciana, ocupava a presidência do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram).

Coura é um defensor histórico dos interesses das mineradoras e, por isso, chamado por ambientalistas de “lobista da mineração” – rótulo que rejeita. Não há dúvida, porém, sobre as suas boas relações. Entre os mil convidados do casamento da filha, estavam o então ministro Fernando Pimentel (PT), depois eleito governador Minas Gerais, o então presidente da Vale, Murilo Ferreira e o vice-governador da época, Alberto Pinto Coelho.

Também prestigiaram o evento os presidentes da Assembleia Legislativa do Estado, Dinis Pinheiro; do Tribunal de Contas, Mauri Torres e da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Olavo Machado.

Donos de jornais circulavam pelo salão ao lado de pelo menos 9 deputados federais e 8 deputados estaduais. Entre os 30 figurões identificados nas fotografias publicadas nas colunas sociais da imprensa mineira, estão personagens que seis anos depois seguem protagonistas, com postos chave nos governos do presidente Jair Bolsonaro e do governador Romeu Zema, como Marcos Montes, secretário-executivo do Ministério da Agricultura e Adriano Magalhães, secretário adjunto do governo de Minas.

A proximidade entre empresários e servidores públicos pode ser menos inocente do que se vê em uma festa de casamento. Foi durante o governo de um dos convidados da festa, Fernando Pimentel (PT), que o estado de Minas Gerais afrouxou a política de licenciamento ambiental. A medida beneficiou a Vale no licenciamento da barragem que rompeu em Brumadinho, em 25 de janeiro, matando 233 pessoas e deixando outros 37 desaparecidos.

O processo de afrouxamento da lei começou antes, ainda em 2014, na gestão de outro convidado, o então governador Alberto Pinto Coelho (PP) quando, em uma reunião a portas fechadas, a Vale sugeriu as mudanças a serem feitas na legislação ambiental – acatadas na gestão do petista. Quem escutava as sugestões dos diretores da Vale, em clima amigável, eram servidores públicos responsáveis por fiscalizar a empresa e suas barragens, conforme revelou a Repórter Brasil.

Desde novembro de 2015, quando a barragem do Fundão rompeu em Mariana, diversas reportagens e estudos mostraram o recorrente e milionário investimento de empresas ou de executivos da mineração em campanhas políticas. Essa proximidade ficou explícita  no casamento da filha de Coura, que hoje exerce o quarto mandato à frente do Sindicato da Indústria Mineral do Estado de Minas Gerais (Sindiextra) e que também é vice-presidente da Federação das Indústrias de Mingas Gerais (Fiemg). Dos cerca de 25 políticos presentes à festa, pelo menos 20 tiveram campanhas financiadas por mineradoras ou siderúrgicas nas eleições de 2010 ou na seguinte ao casamento, em 2014.

O financiamento de campanha por empresas era permitido pela legislação eleitoral até 2015. Porém, escândalos e delações no escopo da operação Lava Jato revelaram conflitos de interesses nessas doações, que foram, posteriormente, consideradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal.

O lobby – que não é regulamentado no Brasil –, pode ser considerado uma atitude legítima, pois representa o direito da sociedade de pressionar para que os políticos atendam seus interesses. A análise é do professor professor Ciência Política da Universidade Federal do Paraná, Adriano Codato. “O problema é que há uma assimetria entre os recursos que uns e outros têm para pressionar a decisão”, analisa Codato, referindo-se à falta de equilíbrio de forças. Ou seja, em uma democracia perfeita, o lobby das mineradoras deveria ter a mesma força do lobby dos ambientalistas.

Essa assimetria de forças é também criticada por Maria Tereza Corujo, do movimento SOS Serra da Piedade. “Para quem defende Minas Gerais, a proximidade de Coura com os políticos é preocupante”, afirma a ambientalista. “O lobby exercido por Coura, pela Sindiextra e pelo Ibram precisa ser investigado. Imagina o que pode estar nos bastidores disso?”, questiona Corujo, que foi a única conselheira do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) a votar, em 11 dezembro de 2018, contra a autorização para obras na barragem de Córrego do Feijão – a que rompeu em Brumadinho.

“Coura é presidente de um sindicato, e não lobista”, respondeu o Sindiextra em nota enviada à Repórter Brasil.

Noivo nomeado

Coura termina de cantar.  Enquanto uns deixam a pista, recolhem os blazers sobre as cadeiras e se preparam para ir embora, outros aplaudem embriagados – talvez pela beleza da vista de um dos espaços mais nobres de Belo Horizonte. O salão do Alta Vila fica no topo de uma torre de 101 metros de altura e proporciona visão panorâmica da capital mineira das cidades vizinhas e das montanhas do quadrilátero ferrífero.

À época do casamento, os convidados ligados ao setor tinham outro motivo para comemorar: a mineração vivia um ótimo momento. A tonelada do minério de ferro era vendida a US$ 137, valor superior aos US$ 88 atuais.

Depois de brindar no casamento e ser eleito governador, Pimentel nomeou o noivo da filha de Coura, José Guilherme Ramos, para o cargo de subsecretário de Política Mineral e Energética do Estado.

Ramos é hoje integrante do Sindiextra e, antes de atuar no governo Pimentel, era conhecido nos corredores e gabinetes da Assembleia Legislativa por defender os interesses das mineradoras.

“As contratações feitas no governo foram efetuadas pelos secretários das pastas correspondentes, que as analisaram tecnicamente”, respondeu a assessoria de imprensa de Pimentel, ao ser questionada sobre o motivo da contratação de Ramos. Já Coura, disse, em nota enviada pelo Sindiextra, que a nomeação de seu genro “ocorreu por critérios técnicos, em razão de sua especialidade”.

Menos de três meses depois do casamento, o Sindiextra pagou R$ 400 mil para uma empresa de consultoria, a OPR, que teve Pimentel como sócio até 2012. À época do pagamento, a empresa era comandada pelo principal assessor do petista, Otílio Prado. O negócio foi revelado pelo jornal O Globo, investigado pela Operação Acrônimo da Polícia Federal e é alvo de inquérito no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Para Coura, “não houve ilícito algum”. Ele acredita que o caso será esclarecido na Justiça.

Na campanha eleitoral de 2014, quando foi eleito governador, a candidatura de Pimentel recebeu R$ 6,4 milhões de doações de 21 empresas mineradoras e siderúrgicas. Quase a metade desse valor (R$ 3,1 milhões) veio de empresas do grupo Vale.

Durante o governo do petista, o projeto de lei 2.946 de autoria do executivo e sancionado em janeiro de 2016 é apontado por ambientalistas como responsável por flexibilizar a fiscalização ambiental. O projeto entrou em vigor três meses após o desastre de Mariana, que matou 19 pessoas e destruiu o ecossistema da bacia do Rio Doce.

A lei gerou uma série de alterações que possibilitou a entrada de um representante do Sindiextra e outro do Ibram como representantes da sociedade civil na Câmara de Atividades Minerárias (CMI) do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam). “Basta assistir a uma das reuniões do conselho  para observar que os interesses deles (Sindiextra e Ibram) são pelo lucro a qualquer custo”, afirma o diretor de meio ambiente e saúde da União de Associações Comunitárias de Congonhas, Sandoval de Souza Pinto Filho.

Passados três meses do rompimento da barragem de Córrego do Feijão da Vale os bombeiros seguem buscando 37 desaparecidos. Até o momento, são 233 mortos (Foto: Corpo de Bombeiros/Divulgação)

Outra mudança ocorrida no Estado foi a deliberação normativa  217 que passou a permitir, em alguns casos, rebaixar o potencial de risco das barragens, o que pode simplificar o processo de licenciamento para apenas uma etapa.

Questionado se a Vale exerceu algum tipo de pressão para alterar a legislação de segurança de barragens, a assessoria de Pimentel respondeu, em nota: “As doações recebidas pela campanha eleitoral mencionada já foram aprovadas pela Justiça, que atestou sua lisura. É falso e ofensivo relacioná-las a medidas adotadas pelo Governo de Minas Gerais”.

A assessoria do ex-governador afirmou que “em nenhum momento, as medidas adotadas previram a concessão indiscriminada de licenças”. O objetivo, segundo Pimentel, foi “modernizar a avaliação de pedidos de licenciamento ambiental”, pois havia uma demanda acumulada em janeiro de 2015, no início do governo, de quase 3 mil processos sem avaliação. Leia a resposta na íntegra.

Suprapartidário

“Comparecer a eventos sociais é parte do dia-a-dia da política. Tanto que outros candidatos à eleição em 2014, inclusive adversários, estiveram na mesma cerimônia”, disse Pimentel ao ser perguntado sobre sua relação com Coura. Entre os adversários do petista na mesma festa estava o vice-governador de Minas, Alberto Pinto Coelho (PP), que assumiu o poder quando Antonio Anastasia (PSDB) se afastou para candidatar ao Senado.

Em 2010, Pinto Coelho recebeu doações de R$ 2,2 milhões de seis empresas siderúrgicas e mineradoras. Foi no período que Pinto Coelho governava, em outubro de 2014, que diretores da Vale se reuniram a portas fechadas com servidores do governo de Minas Gerais para discutir regras para simplificar e acelerar o licenciamento ambiental no Estado, conforme revelaram áudios e documentos obtidos com exclusividade pela Repórter Brasil. Procurado, Pinto Coelho não respondeu às perguntas enviadas.

Do mesmo grupo político de Pinto Coelho, o então presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Dinis Pinheiro (Solidariedade) foi um dos padrinhos do casal. No ano seguinte, Pinheiro foi candidato à vice-governador na chapa encabeçada por Pimenta da Veiga (PSDB). A candidatura deles recebeu R$ 3 milhões em doações de 12 mineradoras e siderúrgicas.

O coordenador político da campanha era Danilo de Castro, homem forte dos governos de Aécio Neves e Anastasia, quando ocupou a secretaria de governo em ambas gestões. O filho de Danilo, Rodrigo de Castro, é deputado federal desde 2007. Na eleição de 2014, Rodrigo recebeu R$ 850 mil doados por mineradoras e siderúrgicas. Tanto Danilo de Castro quanto Dinis Pinheiro não responderam às questões enviadas pela reportagem.

Danilo de Castro está ao lado do hoje senador Carlos Viana (PSD) em uma das fotos da festa. Em seu primeiro mandato, o senador conquistou a relatoria da CPI de Brumadinho. A comissão quer apurar as causas do rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho.

Vídeo produzido pela Repórter Brasil e publicado um mês depois da tragédia mostra o drama das vítimas e a relação conflituosa com a Vale

Na campanha, o senador recebeu doação de R$ 100 mil de Luis Fernando Franceschini da Rosa, advogado e sócio investidor de empresas de mineração. Questionado se a doação eleitoral pode comprometer seu trabalho na CPI, Viana respondeu que não. “Eu sei que é comum políticos se posicionarem de acordo com interesses momentâneos, mas comigo nunca foi e nunca será assim. Nunca estive com o Franceschini. A doação veio por pessoas ligadas ao meu ex-partido, PHS”.

Outros dois políticos que ocuparam cargos de destaque em comissões do congresso voltadas à mineração e que compareceram à festa de casamento foram o ex-deputado Gabriel Guimarães (PT), atualmente diretor do Atlético-MG e Marcos Montes (PSD), secretário-executivo do ministério da Agricultura.

Guimarães e Montes foram presidente e vice, respectivamente, da Comissão Especial sobre o Código da Mineração. Na campanha de 2014, R$ 273 mil foram doados por empresas ligadas à mineração e siderurgia para a campanha do petista. Já a candidatura de Montes arrecadou cerca de R$ 487 mil de empresas do setor.

Guimarães disse que o convite para a festa se deve a relação de amizade que tem com os noivos e não apenas com Fernando Coura. “Só fui porque fui convidado. Não costumo ir a lugar nenhum que não sou convidado”, respondeu. Explicou que manteve contato com os setores produtivos, incluindo as empresas que doaram para sua campanha, mas que elas não tiveram influência em sua atuação parlamentar. “Isso seria crime. Eu sou advogado e sei os limites da atuação”, afirmou.  Procurado, Marcos Montes não respondeu ao pedido de entrevista.

Assim como Montes, o ex-secretário de Meio Ambiente, Adriano Magalhães, é outro que participou da festa e segue no poder. Magalhães foi nomeado pelo governador Romeu Zema para secretário adjunto da secretaria de Desenvolvimento Econômico. Um ano depois do casamento, em abril de 2014, Magalhães foi exonerado do cargo que ocupava, como secretário de Meio Ambiente no governo Anastasia. Ele é réu por prevaricação, acusado de ocultar autos de fiscalização e infração emitidos contra a mineradora MMX, de Eike Batista, de acordo com denúncia do Ministério Público. Procurado, Magalhães não respondeu às perguntas enviadas.

O prefeito de Nova Lima, Vitor Penido, pela sexta vez no comando da cidade foi outro convidado para festa que segue no poder. “Eu sou o maior defensor de mineradora do Brasil e o mais antipatizado entre ambientalistas”, afirma o prefeito, que é fundador e atual presidente da Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais (AMIG).

Penido é um velho conhecido de Coura e diz que nunca foi procurado por ele para “pedir nada que não fosse correto”. Além disso, o prefeito entende que Coura exerce o papel de líder das mineradoras e tem que brigar por elas. Na campanha de 2014, quando foi candidato à deputado federal, Penido recebeu R$ 325 mil de empresas do setor minerário.

Alarme falso

A cidade governada por Penido teve 170 pessoas desalojadas, em fevereiro, devido ao aumento do risco de rompimento das barragens da mina Mar Azul, da Vale. A retirada de moradores das casas localizadas em áreas de risco se tornaram uma constante em Minas desde o rompimento da barragem da Vale.

Em março, em outra cidade mineira, São Gonçalo do Rio Abaixo, uma sirene acabou com a festa de casamento da estudante de educação física, Ananeria Toceda da Cruz, de 24 anos com o eletricista Breno Lucas da Cruz, de 37 anos. “Foi uma confusão tremenda. Todo mundo saiu correndo. Ninguém quis esperar para ver se era verdade ou não”, conta a noiva.

Os 150 convidados deixaram o local desesperados. Uma mulher que carregava uma criança no colo caiu e quase foi atropelada na confusão. “Quando soube que era alarme falso, tive uma sensação de alívio. Mas depois que passa o susto fica uma frustração, um vazio”, recorda.

A Vale atribuiu o disparo da sirene a um erro técnico. A festa foi encerrada antes das fotos oficiais, dos noivos partirem o bolo e, ao menos, provarem os docinhos. “Não comi o mousse de limão nem o bombom de coco”, lamenta a noiva.

Fuente: https://outraspalavras.net/outrasmidias/o-baile-da-lama/?fbclid=IwAR2AxLAEzBpa0uP3egO9GX9qCzRdwGtBVsv3K597rY6uTqIGgLJnJjvKF_o

Brasil

Risco de rompimento em MG pode ser maior do que informou a Vale, diz Ministério Público

RIO – O Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) avalia que o risco envolvido no possível rompimento de uma estrutura daVale em Minas Gerais (MG) pode ser maior do que o informado anteriormente pela mineradora . Durante a semana, o MP recebeu um documento relativo ao possível rompimento do talude norte da cava da mina de Gongo Soco, em Barão de Cocais, entre domingo e o próximo sábado. O pedido dos procuradores agora, já com chancela judicial, é que a Vale atualize os estudos sobre os possíveis impactos de um acidente, que poderia provocar consequências graves caso atinja a barragem Sul Superior da mina. A Justiça concedeu prazo de 72h para a ação seja realizada.

Em decisão proferida na sexta-feira, a juíza Fernanda Chaves Carreira Machado, do Tribunal de Justiça de MG, determinou o prazo de três dias para apresentação do chamado «estudo de dam brake» e estipulou em R$ 300 milhões a multa em caso de descumprimento. Em decisão judicial anterior, a Vale já havia sido convocada a apresentar esses dados, mas não forneceu dados sobre o impacto da mancha de inundação para o caso de rompimento de toda a estrutura.

De acordo com o MP, «a situação do complexo minerário, conforme informações fornecidas pela própria empresa, está pior». Há, de acordo com o órgão, um risco somado de rompimento da própria barragem de alteamento e de desabamento do talude da cava norte, localizado acima da barragem. As consequências do rompimento do talude envolveriam o lançamento de mais materiais, água e rejeitos sobre a barragem Sul Superior, que já está sob alerta.

Para a magistrada, “o descumprimento da liminar e o cenário calamitoso autorizam a majoração da multa, antes mesmo da oitiva da empresa, como forma de lhe impulsionar a iniciativa de resguardar a dignidade do povo cocaiense e contribuir com a segurança da sociedade que vive no local onde a mineradora aufere bilhões em lucro”.

Em nota, a Vale informou que, no prazo fixado pela determinação judicial, «apresentou o relatório mais atualizado de dam break da Barragem Sul Superior, explicando naquela oportunidade a adequação dos critérios técnicos». A empresa diz que não foi intimada de qualquer «decisão quanto a eventual descumprimento da decisão liminar».

Brasil

Otra represa de Vale podría sucumbir

La represa de Barão de Cocais podría colapsar para el 25 de mayo

Según informa el MAB (Movimiento de Personas Afectadas por Represas de Brasil), tras los desastres de Mariana (2017) y Brumadinho (enero 2019) otra represa de Vale podría sucumbir en los próximos días. Se trata de la represa de la mina Gongo Soco, en la ciudad de Barão de Cocais, cuya pared presentó un movimiento el pasado martes (14), según información de la Defensa Civil de Minas Gerais. En caso de que se rompiera podría provocar la licuefacción del Embalse Sur Superior que está a 1,5 km de distancia.

En el documento, la propia Vale, responsable de la represa Sur Superior y del rompimiento de las represas de Fundão y Córrego de Feijão, afirma que el movimiento en el talud es frecuente, si continúa, la represa podría romperse para el día 25 de mayo. Los desechos alcanzarían una extensión de 72,5 km y llegarían a las ciudades de Barão de Cocais, Santa Bárbara y São Gonçalo del Río Abajo, además de un tramo de la BR-381.

El Ministerio Público de Minas Gerais (MPMG) recomendó a la empresa Vale que informe a la población inmediatamente sobre las condiciones estructurales de la represa y proporcione atención médica, psicológica, además de alimentación, transporte y todo lo que sea necesario para los residentes de la ciudad.

La represa Sur Superior tiene alrededor de 6 millones de metros cúbicos de desechos de mineral de hierro y 85 metros de altura. El 8 de febrero la sirena fue accionada por riesgo de rompimiento y al final del mismo mes tuvo su nivel de alerta elevado al máximo, de 2 a 3, por orientación de la Agencia Nacional y Minería (ANM). Cerca de 500 personas salieron corriendo de sus casas en las comunidades de Socorro, Tablero y Piteiras, y permanecen hasta hoy fuera de casa.

Brasil

Vale diz ao MP que talude de mina em Barão de Cocais pode se romper a partir de domingo

Talude da Mina Gongo Soco corre risco de romper até o dia 25 deste mês
Talude da Mina Gongo Soco corre risco de romper até o dia 25 deste mês

Talude da Mina Gongo Soco corre risco de romper até o dia 25 deste mês

Barragem Sul Superior fica na Mina Gongo Soco, em Barão de Cocais, na Região Central de MG — Foto: Reprodução/TV GloboBarragem Sul Superior fica na Mina Gongo Soco, em Barão de Cocais, na Região Central de MG — Foto: Reprodução/TV Globo

Barragem Sul Superior fica na Mina Gongo Soco, em Barão de Cocais, na Região Central de MG — Foto: Reprodução/TV Globo

O Ministério Público de Minas Gerais expediu, nesta quinta-feira (16), recomendação à Vale para que a mineradora mantenha a população de Barão de Cocais informada sobre os riscos, danos e impactos de um possível rompimento da Barragem Sul Superior. Na terça-feira (14), a Vale confirmou que houve uma movimentação no talude norte da Cava de Gongo Soco. De acordo com a da Defesa Civil de Minas Gerais, a estrutura está se deslocando cerca de quatro centímetros por dia e pode atingir a barragem em caso de ruptura.

A recomendação foi dada depois que o Ministério Público obteve, da própria Vale, documento que confirma que, caso permaneça a velocidade de aceleração de movimentação, há possibilidade de rompimento da estrutura entre os dias 19 e 25 de maio.

A barragem é do mesmo tipo da de Brumadinho, que se rompeu em 25 de janeiro. Até esta tarde, a Defesa Civil calculava que a tragédia tinha deixado 240 mortos – 32 seguem desaparecidos.

De acordo com a Vale, a cava da mina fica a 1,5 quilômetro da barragem e não há “elementos técnicos até o momento para se afirmar que o eventual escorregamento do talude Norte da Cava da Mina Gongo Soco desencadeará gatilho para a ruptura da Barragem Sul Superior”. A empresa afirmou ainda que a cava e a barragem são monitoradas 24 horas por dia.

Um novo simulado em Barão de Cocais está agendado para este sábado (18).

Apoio à população

O Ministério Público recomenda, ainda, que a mineradora forneça apoio logístico, psicológico, médico, além de alimentação às pessoas que podem ser atingidas.

A empresa também deve manter um posto de atendimento 24 horas nas proximidades dos centros das cidades de Barão de Cocais, Santa Bárbara e São Gonçalo do Rio Abaixo. Estes postos devem ter equipes multidisciplinares preparadas para acolhimento, atendimento às comunidades.

Segundo o MP, a Vale tem seis horas para informar ao órgão as medidas adotadas.

Dimensão dos danos

A Defesa Civil Estadual disse, na quarta-feira (15), que, caso haja deslocamento da estrutura, ainda não se sabe a força, nem a quantidade de material que seria levado para dentro da cava, que fica atrás da Barragem Sul Superior.

G1 questionou, nesta quinta, se a Defesa Civil já tem informações sobre a dimensão dos danos caso haja rompimento do talude, mas o porta-voz da corporação, tenente-coronel Flávio Godinho, estava em reunião e não se pronunciou sobre o assunto.

Até a última atualização desta reportagem, a Vale não tinha se posicionado sobre a recomendação.

Barragem Sul Superior em Barão de Cocais — Foto: Arte/G1Barragem Sul Superior em Barão de Cocais — Foto: Arte/G1

Barragem Sul Superior em Barão de Cocais — Foto: Arte/G1

Alteração trem Vitória-Minas

Por causa do risco de rompimento do talude da mina Gongo Soco, a mineradora anunciou que a circulação do trem de passageiros Vitória-Minas vai ser alterada por tempo indeterminado já a partir desta quinta-feira (16).

G1 no MG1: Risco em mina da Vale em Barão de Cocais altera circulação de trem
MG1
G1 no MG1: Risco em mina da Vale em Barão de Cocais altera circulação de trem

G1 no MG1: Risco em mina da Vale em Barão de Cocais altera circulação de trem

Alerta ocorreu em fevereiro

No início de fevereiro, as sirenes da Vale foram acionadas pela primeira vez na cidade, depois que a consultoria contratada pela empresa se negou a dar laudo de estabilidade. A Agência Nacional de Mineração tinha determinado a retirada de 239 moradores das comunidades de Socorro, Tabuleiro e Piteiras.

Em março, a barragem Sul Superior entrou em alerta máximo para o risco de rompimento. As sirenes foram acionadas pela segunda vez, quando o nível de segurança da barragem que estava em 2 foi alterado para 3.

Sete pontos de fuga foram divulgados pela Defesa Civil de Minas Gerais para orientar moradores de Barão de Cocais em caso de rompimento da Barragem Superior Sul. As localidades estão fora da mancha de inundação prevista em caso de desastre com a estrutura da mineradora Vale.

Sete pontos de fuga serão usados em simulado de emergência em barragem em Barão de Cocais — Foto: Rodrigo Cunha de Paula/Arte G1Sete pontos de fuga serão usados em simulado de emergência em barragem em Barão de Cocais — Foto: Rodrigo Cunha de Paula/Arte G1

Sete pontos de fuga serão usados em simulado de emergência em barragem em Barão de Cocais — Foto: Rodrigo Cunha de Paula/Arte G1

O jornalista da Globo Minas Fernando Zuba obteve, com exclusividade, o documento enviado pela Vale ao Ministério Público que mostra a localização e a situação do talude:

Localização do talude norte da Mina de Gongo Soco — Foto: Vale/DivulgaçãoLocalização do talude norte da Mina de Gongo Soco — Foto: Vale/Divulgação

Localização do talude norte da Mina de Gongo Soco — Foto: Vale/Divulgação

Em documento enviado ao MP, Vale mostra área com maior risco de rompimento do talude norte (em laranja). — Foto: ReproduçãoEm documento enviado ao MP, Vale mostra área com maior risco de rompimento do talude norte (em laranja). — Foto: Reprodução

Em documento enviado ao MP, Vale mostra área com maior risco de rompimento do talude norte (em laranja). — Foto: Reprodução.

Fuente: https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2019/05/16/mp-recomenda-a-vale-que-informe-moradores-sobre-situacao-da-barragem-em-barao-de-cocais.ghtml?fbclid=IwAR3B_3_2I2WQnWFl9J6-Fiez3xI31m5PPpn0FdF–dEYRN3FGsJCo_Vnoco

Brasil, Internacional

“Paren de deforestar”, el reclamo de 600 científicos a los negocios mineros de Brasil y la Unión Europea

Un grupo científicos europeos, junto a 300 organizaciones indígenas, han instado a la Unión Europea (UE) que modifique las actuales negociaciones comerciales con Brasil para que su presidente Jair Bolsonaro respete el medio ambiente y los derechos humanos.

“La UE gastó más de 3.000 millones de euros en hierro brasileño en 2017, a pesar de los peligrosos estándares de seguridad y la extensa deforestación provocada por la minería”, afirmaron los investigadores a través de una carta abierta, publicada el 25 de abril en la revista Science.

Brasil uno de los países más ricos en biodiversidad del mundo y el que alberga la mayor parte de la selva amazónica. Solo en 2011, según los firmantes, el viejo continente importó del país sudamericano cantidades de carne y alimento para el ganado asociadas a una deforestación de más de 1.000 kilómetros cuadrados, una superficie “equivalente a más de 300 campos de fútbol al día”.

“Los consumidores europeos no tienen manera de saber cuánta sangre hay realmente en sus hamburguesas. La UE tiene la oportunidad de hacer de la sostenibilidad la piedra angular de sus negociaciones comerciales con Brasil”, señaló el comunicado, que fue encabezado por la ecóloga Laura Kehoe, de la Universidad de Oxford (Reino Unido).

Kehoe es una joven investigadora postdoctoral en Oxford que ha trabajado en proyectos medioambientales en Bolivia, Sudáfrica, Guinea, Canadá y México. Según los estudios que impulsó, “la UE gasta más de 2.000 millones de euros cada año en alimento para el ganado comprado en Brasil, pese a no saber si proviene de tierras deforestadas”.

La finlandesa Heidi Hautala, vicepresidenta del Parlamento Europeo y política del Grupo de los Verdes/Alianza Libre Europea, ha respaldado públicamente el llamamiento de los investigadores. Los eurodiputados españoles Jordi Solé, de Esquerra Republicana de Catalunya, y Florent Marcellesi, de Equo, también han apoyado a los firmantes.

Kehoe ha llegado a asegurar que “el genocidio es una posibilidad real si no se hace nada para proteger a los pueblos indígenas y sus tierras”.

El ultraderechista Bolsonaro alcanzó la presidencia de Brasil proclamando que acabaría con “el activismo ambiental” y con la “industria de demarcación” de tierras indígenas. Pese a que finalmente descartó quitar a Brasil del Acuerdo de París, como prometido durante la campaña electoral, logró que el país desista de la realización de la próxima Cumbre del Clima, que finalmente se llevará a cabo en Chile.

Fuente: https://www.foroambiental.net/paren-de-deforestar-el-reclamo-de-600-cientificos-a-los-negocios-mineros-de-brasil-y-la-union-europea/?fbclid=IwAR2spzVsR5mFy9jbcS0xLYD9hVgGBaM-pWRCyRQ_kSGlbNCfgwN1mDS1S5I

Brasil

Conheça os ‘acionistas ativistas’ e suas estratégias para ganhar voz nas assembleias

RIO — Há duas semanas, índios guaranis Mbya levaram quase 11 horas de ônibus entre Parelheiros, no interior paulista, e Curitiba em uma viagem de ônibus para participar de uma assembleia de acionistas. Nas mãos, algumas ações da Rumo Logística, o suficiente para ter o direito de entrar e falar sobre os impactos de um projeto sobre seu povo.

Uma semana depois, Carolina de Moura voou de Minas Gerais para o Rio para se sentar entre detentores de papéis da Vale , como ela, e expor as consequências do rompimento da barragem da empresa que deixou 270 mortos e desaparecidos em Brumadinho há três meses. O esforço é parecido com o de José Martins Ribeiro, de 78 anos, que há 51 frequenta assembleias da Petrobras .

Como eles, pessoas físicas que têm causas sociais ligadas a empresas vêm comprando ações para participar de assembleias de acionistas e ganhar voz dentro das companhias. Embora o movimento seja novo no Brasil, os acionistas ativistas já são conhecidos em países desenvolvidos, onde a cultura de investimentos em ações é maior. Minoritários levam uma nova voz às assembleias e cobram transparência e alinhamento com temas que não dizem respeito só ao lucro. O poder de voto destes acionistas, porém, é proporcional à fatia do capital da companhia que eles detêm.

— Isso é comum no exterior. Em 2002, numa assembleia da GE, freiras compraram ações para questionar a postura da empresa sobre o meio ambiente. No ano passado, acionistas da Disney questionaram a remuneração dos executivos — conta Renato Chaves, conselheiro de empresas e especialista em governança, para quem a chegada da tendência ao Brasil reflete a maior insatisfação com a gestão das empresas. — A assembleia no Brasil é feita, muitas vezes, para cumprir tabela. A má governança traz consequências físicas e perdas de valor.

Papéis pela internet

Inspirados nessa estratégia, os índios Mbya decidiram comprar ações da Rumo a poucos dias da assembleia marcada para 24 de abril . Seria a única forma de expor aos diretores da empresa sua reivindicação de compensações pelos impactos da duplicação da ferrovia Itirapina-Cubatão, em São Paulo. Tiago dos Santos, líder da Terra Indígena Tenondé Porã, conta que os papéis foram comprados num banco on-line pouco antes da partida para Curitiba.

— A gente também tem nossos assessores jurídicos. Pesquisamos a fundo para ver se era viável comprar ações. E começamos a correr — conta Tiago, em entrevista por meio do WhatsApp, lembrando que a maior dificuldade foi formalizar em papel a condição de acionista para não ser barrado na porta. — Só um dia antes conseguimos toda a papelada.

A Rumo Logística informou que reconhece que o mercado acionário é aberto a qualquer pessoa que queira investir e participar das assembleias. Sobre a obra, diz ter as licenças necessárias e contar com mediação da Funai e do Ibama para atender os indígenas.

A estratégia conquistou o grupo Articulação dos Atingidos e Atingidas pela Vale, que reúne parentes das vítimas de desastres causados por atividades da mineradora. Na última terça-feira, dez representantes foram à sede da empresa, no Rio, protestar como acionistas. Colocaram placas com os nomes dos mortos e desaparecidos após o rompimento da barragem de Brumadinho. Integrante do grupo, Carolina explica que o objetivo de comprar ações foi poder registrar as reivindicações dos atingidos na ata da reunião. Assim, querem evitar o argumento de que a empresa não sabia.

— A Articulação já participa de assembleias da Vale desde 2010. Não vamos nos calar. A empresa tem que investir tudo o que ganha na melhoria dos rios e se preocupar com vidas humanas — defende Carolina.

A Vale diz respeitar o direito de livre manifestação pacífica.

Meio século de ativismo

Dos seus 78 anos, o administrador José Martins Ribeiro já dedicou 51 a ir aos encontros de acionistas da Petrobras cobrar mais transparência. Preocupado com o patrimônio da maior estatal do país, quer proteger a empresa da corrupção.

Ribeiro se considera um acionista da estatal desde os anos 1950, quando quem abastecia nos postos da companhia ganhava um cupom que depois era convertido em ações preferenciais. Nos últimos anos, passou a falar sempre nas assembleias. Tentou até ser membro do Conselho de Administração, sem sucesso:

— A União é a controladora. Você chega à assembleia, e as decisões já estão tomadas. Não há espaço para outras vozes buscarem direitos — reclama.

A Petrobras não comentou.

Para Flávia Maranho, coordenadora da Celso Lisboa Escola de Negócios, o objetivo do ativismo de acionistas é tentar influenciar as práticas e políticas da companhia:

— O ativismo pode beneficiar, em particular, as partes interessadas que dependem da boa atuação dos investidores institucionais. Para as empresas,  esse movimento pode melhorar a confiança e a credibilidade diante do mercado, permitindo obtenção de capital a custos mais baixos.

Fuente: https://oglobo.globo.com/economia/conheca-os-acionistas-ativistas-suas-estrategias-para-ganhar-voz-nas-assembleias-23642886?fbclid=IwAR0AEb46g3GjVaG6aDn9DV8xW_o16c3tbyFNawJ6_DxX5fFP-FW4eYRvb9Y

Brasil

A maldição das minas no Brasil: entre o medo do desemprego e o fantasma da impunidade

As legiões de aventureiros avarentos que penetraram nestas terras do Brasil no século XVIII não pararam para pensar que o ouro não se come. Alguns morreram de fome com pedras brutas no bolso. Não havia comida, estradas nem comércio. Aquela febre do ouro estabeleceu as bases de um Estado que deve quase tudo às minas. Seu nome, seu desenvolvimento, seu patrimônio histórico e sua economia. A paisagem verde de Minas Geraisé pontilhada por enormes lacunas de ocre intenso que a mineração escava na terra e por depósitos descomunais para colocar os resíduos que essa atividade gera. O colapso de uma dessas barragens em Brumadinho matou há cem dias, completados neste domingo, 235 pessoas. Outras 35 − também devoradas em segundos pela avalanche de rejeitos − continuam desaparecidas. A Vale, empresa proprietária da mina e uma das maiores multinacionais brasileiras, é reincidente. A tragédia provocou uma grande onda de indignação popular que levou a algumas poucas mudanças, mas o medo de que se repita está muito presente.

Maria Lourdes Anunciação, de 64 anos, vive tomada pelo medo em uma moradia de tijolos descobertos muito perto de uma barragem quatro vezes maior do que a que se rompeu em 25 de janeiro em Brumadinho. Não é a única. Nada menos que 23 depósitos de resíduos rodeiam Congonhas, uma cidade turística de 50.000 habitantes. Só uma colina separa a família Anunciação da mais próxima. Eles contam depois do desastre as autoridades fecharam a escola, e ficou nisso. “Depois de Brumadinho, não fizeram nenhuma simulação. Só a sirene, que tocou uma vez. Eram quase nove da manhã e quase ninguém ouviu. Tocou muito baixo”, recorda Maria. As vítimas de Brumadinho também não a ouviram, porque não tocou. “As pessoas têm mais medo das barragens agora, mas do desemprego também”, aponta sua filha Tatiane. Elas, como tantos na área, têm parentes que trabalham no setor.

As minas são a grande fonte de emprego local. E um potente motor da economia nacional, tanto que a mineração em Minas Gerais contribui com 8% das exportações brasileiras, que mesmo em épocas de crise é um gigante econômico. E, no setor, reina a Vale. Fundada em 1942 e privatizada em 1997, é a maior produtora de minério de ferro do mundo. Seu poder é enorme. A proclamação “Mariana nunca mais”, adotada por seu presidente, o agora substituído Fabio Schvartsman, depois de uma tragédia escandalosamente similar em 2015, ficou sepultada sob toneladas de ferro em Brumadinho. O rompimento da barragem de Mariana matou 19 pessoas, e causou o maior desastre ecológico do Brasil.

“Se você não está a favor de Vale, é um inimigo. A Vale não dialoga, a Vale manda”, afirma o professor Evandro Moraes, da Universidade Federal de Minas Gerais, que estuda há décadas estas represas de resíduos minerais. Ele insiste que os acadêmicos sabem há muito tempo que, à medida que a terra vai ficando menos rica em minerais, os resíduos aumentam. Moraes está convencido de que sem mudanças profundas, haverá novos desastres. “É necessário mudar o ciclo econômico”, diz, diante do desafio de administrar cada vez mais resíduos. Soluções existem, afirma. Estão em estudos feitos pela universidade − e são economicamente viáveis, assegura. Os resíduos poderiam ser transformados em cimento. Mas, segundo ele, a Vale não demonstrou nenhum interesse. “Ela não dialoga com o mundo acadêmico, nem com a sociedade civil… só o Ministério Público consegue se impor à Vale”, aponta o professor.

Andressa Lanchotti é a coordenadora da equipe de promotores de Minas Gerais e de agentes da Polícia Federal que investiga o que ocorreu em Brumadinho. “Precisamos de uma mudança de comportamento muito grande para recuperar a confiança, porque em menos de três anos houve dois desastres envolvendo a mesma empresa [a Vale] em duas minas que tinham um certificado de estabilidade e uma auditoria externa. E as duas se romperam. Isso significa uma falta de credibilidade não só da Vale, mas de todo o sistema brasileiro de gestão de barragens”, explica a promotora em seu escritório em Belo Horizonte. Lanchotti considera que o Estado deve assumir a fiscalização, que hoje é praticamente um autocontrole das empresas. Há 34 inspetores de barragens no Brasil inteiro, quando o Estado de Minas Gerais sozinho é maior do que toda a Espanha.

Um decreto do Governo de Jair Bolsonaro ordenou que sejam desmantelados em três anos todos os depósitos de mineração construídos com a técnica de alteamento a montante, a mais barata e perigosa porque não tem alicerces nem muros. Foi essa a técnica usada nas duas barragens que desmoronaram. Nestes cem dias, o Ministério Público ordenou que a Vale paralise as atividades em oito barragens e pague mil reais mensais durante um ano a cada um dos 40.000 moradores de Brumadinho, determinou a realização de inspeções independentes, bloqueou milhões de reais em fundos da empresa para enfrentar a emergência, pediu o afastamento de Schvartsman da presidência e retirou seu passaporte.

Segundo a promotora, “existem tecnologias modernas que são usadas em outros Estados (do Brasil) e em outros países” para administrar resíduos de mineração, mas “aqui não se fazia isso porque não era prioridade por questões econômicas”.

A fiscalização é um ponto fraco no Brasil, como reconheceu o vice-presidente Hamilton Mourão em uma entrevista ao EL PAÍS logo após a tragédia. A Agência de Mineração inspecionou cerca de cem barragens nestes três meses, a maioria em Minas Gerais, mas o organismo ainda está elaborando suas conclusões, segundo um porta-voz. Esses imensos depósitos são organismos vivos, dizem os especialistas. “São como um leão em uma jaula, sempre a ponto de morder”, explica o professor. Costumam se romper porque seu conteúdo se liquefaz. É um fenômeno misterioso. “Nem os cientistas sabem por que ocorre”, afirma Moraes, um engenheiro e geólogo que em sua longa carreira foi consultor da Vale e de outras empresas de mineração. Três dos depósitos estão em um nível de emergência tão alto que cerca de mil pessoas, segundo a multinacional, foram retiradas das áreas próximas. A isso se somam os danos colaterais para o sustento de milhares de pessoas.

O Ministério Público investiga 26 pessoas por crimes contra a vida e o meio ambiente (com Schvartsman encabeçando a lista), já deteve preventivamente 13 engenheiros e auditores, mas ainda não há um relatório preliminar sobre as causas do colapso.

Wilson Moreira, de 64 anos, não acompanha em detalhes as medidas adotadas pela promotoria e pela Vale, nem as denúncias da imprensa. O que ele sabe é que perdeu um filho. Cleiton Luiz tinha 29 anos. “Foi encontrado na terça-feira de Carnaval [um mês depois da tragédia]. Só me deram uma caixa com uma foto dele em cima. Suponho que fosse ele. Não era permitido abri-la”, explica em Brumadinho este comerciante, que além disso viu como a economia local se arruinou e suas duas lojas perderam clientela. “Ele nunca falou que sentisse risco, gostava do trabalho. Morreu inocente.” Wilson interrompe seu relato com risos nervosos. Está convencido de que “se o Ministério Público funcionasse, a Vale estaria fechada por segurança”. Mas também diz que a empresa não pode desaparecer porque é vital para que as pessoas ganhem a vida. Quem diria em 1978, quando ele dirigia um caminhão que levava resíduos para a barragem, que aquele lodaçal cresceria exponencialmente e mataria seu filho. A busca pelos desaparecidos prossegue. A bombeira militar Priscila vasculhava a lama com um guindaste esta semana em busca de qualquer resto humano ou objeto. “Ontem achamos uma agenda, espero que sirva para encontrar a alguém.”

Em Mariana não havia sirenes. E em Brumadinho não chegaram a tocar. “Os sistemas de alarme têm de ser automáticos”, diz o bombeiro civil Pedro Cruz, de 31 anos, enquanto visita com sua namorada, Germana Souza, a igreja de Congonhas que abriga famosas esculturas barrocas de Aleijadinho pagas com os lucros da mineração, que atraem milhares de turistas para a cidade.

Com 55.000 empregados no Brasil e um faturamento de 36,5 bilhões de dólares (143,8 bilhões de reais), a Vale gera muita riqueza. E seu poder e influência são enormes. Brumadinho fez suas ações na Bolsa despencarem, mas agora já são cotadas como antes que o tsunami de rejeitos engolisse seus empregados, muitos deles enquanto almoçavam no refeitório. Devido ao desastre e à paralisação por ordem judicial de três minas, serão produzidas 62,8 milhões de toneladas a menos este ano, explica a empresa. Isso representa 15% do minério de ferro que ela produziu no ano passado. E tem impacto no mercado mundial. A queda, segundo o professor Moraes, fez o preço do minério de ferro subir, o que reduz as perdas, e além disso outras empresas já reativaram minas que não exploravam.

O fantasma de que os responsáveis máximos fiquem impunes está rondando. Basta ver o que ocorreu em Mariana, onde o tsunami de resíduos arrasou duas cidades e percorreu mais de 600 quilômetros até o Atlântico, alterando as vidas de centenas de milhares de pessoas e prejudicando gravemente o ecossistema. Três anos depois, ninguém foi condenado. Não há data para o julgamento e a proprietária da mina − a Samarco, controlada pela Vale e pela australiana BHP Billiton − pagou uma ínfima parte das multas por danos ambientais porque recorreu delas. “Depois de Mariana, muito pouco foi feito. Fazia três anos que estávamos anunciando que haveria mais desastres”, diz Fabiana Alves, do Greenpeace.

Um veterano do setor de mineração que também teve responsabilidades em políticas públicas nessa área e pede para ficar no anonimato diz que a sucessão de desastres “é totalmente inadmissível”, mas ressalta que, segundo as estatísticas, há dois ou três rompimentos por ano. “Até o Canadá, um país com um aparato legal considerado bom, ótimos consultores e uma tradição de excelência em atividades de mineração, teve rompimentos de barragens todos os anos entre 2011 e 2014.” No entanto, os danos no Brasil são incomparáveis àqueles.

Esse especialista opina que a legislação e a fiscalização são insuficientes para evitar acidentes. “É fundamental ter um projeto de alta qualidade, que a construção obedeça às melhores práticas da engenharia e, principalmente, que seja operada com rigor técnico”, afirma.

Sebastião José dos Santos, de 61 anos, vive na cidade rodeada por 23 depósitos de resíduos. Esse técnico de manutenção em uma mina acredita que elas são seguras: “Como filho de Congonhas e empregado da CSN [Companhia Siderúrgica Nacional], estou convencido de que aqui não teremos nenhuma catástrofe como as de Brumadinho e Mariana”. Depois de um tempo de conversa, surge uma certa dúvida quando ele diz: “Se alguma barragem se romper, e não vai se romper, todos vamos sofrer”.

Fuente: https://brasil.elpais.com/brasil/2019/05/04/politica/1556925352_146651.html?fbclid=IwAR13YxLDeol0Jtywlyy_NygZv_xOmEVq4RCTO0yXfBxjqyarOiGaIo7DxK0

Brasil, Iglesias y Mineria

Obispo de Brumadinho: La minería nos ha dejado muchas víctimas, mucha sangre en nuestros ríos, mucha devastación y muchas muertes

Dom Vicente Ferreira, obispo auxiliar de la Arquidiócesis de Belo Horizonte, responsable por Brumadinho, es una persona muy sensible a los dolores de su pueblo y nos llama a reflexionar profundamente sobre el tema de la minería en nuestras comunidades. Sus declaraciones las hizo en Aparecida, durante el encuentro promovido por el Grupo de Trabajo sobre Minería de la CNBB y la Red Iglesias y Minería, este 30 de abril.

“Yo acompaño directamente al pueblo de Brumadinho, y puedo sentir en mi corazón de obispo, cómo ese pueblo está sufriendo”, manifiesta con dolor.

Dom Vicente, obispo con olor a oveja y que experimenta de cerca la tragedia de su pueblo y del medio ambiente, no tiene dudas sobre cuál debe ser el papel de la Iglesia en los territorios afectados por la minería.

“El papel de la Iglesia en este pueblo es primeramente apoyar, acoger, visitar las familias. Ayudar materialmente en todo lo que sea posible. Pero, sobre todo no perder la voz profética. La minería en Minas Gerais, en Brasil necesita ser un tema muy profundizado en la consciencia colectiva de todos nosotros. No puede ser sólo un tema lateral en los debates, es algo que hacen nuestras comunidades y por lo tanto las comunidades deben estar muy alertas y discutir para crear consciencia que la minería es un asunto muy serio. Porque nos ha dejado muchas secuelas, muchas víctimas, mucha sangre en nuestros ríos, mucha devastación y muchas muertes. ¿Por qué tiene que ser así?

Cuando termine la actividad minera, se pregunta Dom Vicente Ferreira, ¿Qué pasará en nuestras comunidades? “cuando termine todo eso, nosotros vamos a tomar los minerales, pero el agua cómo queda, ¿qué hacemos con ella?… Entonces, vean cuantas preguntas debemos responder como cristianos a la luz del Evangelio. Y yo que estoy allá en la región de Brumadinho, puedo dar este testimonio. Por favor, Reflexione y comprométase con nosotros«,

 
 
Brasil, Internacional

Dizer que povos indígenas estão sentados sobre imensas reservas minerais é racismo puro e simples.

No debate sobre a mineração em terras indígenas, “o Canadá está alguns passos à frente do Brasil” e “as universidades têm desempenhado um papel importante no sentido de estimular a reflexão franca e o debate aprofundado sobre a mineração em terras indígenas, aproximando governos, empresas e povos indígenas em seminários acadêmicos”, diz Leonardo Barros, doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais, à IHU On-Line. “Não tenho conhecimento de que os pronunciamentos do governo brasileiro no sentido de liberar a mineração em terras indígenas tenham dado ensejo a um grande debate acadêmico, ou mesmo na esfera pública mais ampliada, por aqui”, diz, ao comentar as iniciativas do presidente Jair Bolsonaro, favoráveis à exploração mineral em terras indígenas.

Na entrevista a seguir, concedida por e-mail, o pesquisador informa que o Canadá, assim como o Brasil, tem “uma imensa população tradicional composta pelos Inuit, os povos tradicionais do Ártico, os chamados Métis, população com ancestralidade mista entre indígenas e colonos europeus e, por fim, as chamadas ‘Primeiras Nações’ (First Nations), povos indígenas da forma como conhecemos o conceito aqui no país”, e que os dois países “comungam de uma história de relações ambíguas com seus povos indígenas” e “buscaram, por métodos diferentes, ‘integrar’ suas populações indígenas ao conjunto da sociedade colonizadora”.

Leonardo Barros é autor da tese “(Un)changing Indigenous land claims: evidences from a cross-national comparison between Canada and Brazil” ((I)mutáveis reivindicações de terras indígenas: evidências de uma comparação transnacional entre Canadá e Brasil – tradução livre), que apresenta um estudo comparativo acerca de como indígenas canadenses e brasileiros têm participado das políticas indigenistas de seus países e atuado em suas terras, e de como empresas e instituições federais têm se envolvido nos processos de extração mineral em terras indígenas. Entre as diferenças que envolvem o reconhecimento das terras indígenas nos dois países, Barros pontua que “os territórios indígenas canadenses são reconhecidos por meio de um tratado assinado entre governo e povos indígenas e, neste acordo, são esclarecidos os termos relativos à possibilidade de empreendimentos econômicos, incluindo atividades de mineração. Já as terras indígenas brasileirassão reconhecidas mediante um processo constitucionalizado que finda com um conjunto de direitos imediatamente reconhecidos, não passíveis de negociação bilateral entre povos indígenas e corporações”.

De acordo com ele, embora do ponto de vista legal as terras indígenas canadenses estejam “mais abertas a empreendimentos econômicos do que as terras indígenas brasileiras”, não há consenso entre as comunidades canadenses sobre o tema. “Algumas lideranças dos povos tradicionais que embarcam em parcerias com empreendimentos minerários argumentam que as relações entre as partes não precisam ser, necessariamente, conflituosas, e que um relacionamento mutuamente benéfico pode ser obtido quando da consideração, a sério, do ponto de vista destes povos no desenho e na implementação dos projetos. Estas lideranças, em conjunto com executivos de mineradoras, buscam um acordo de boa-fé que possa, efetivamente, significar a melhoria de vida para as comunidades envolvidas”, conta. Já os que são contrários à atividade mineral em terras indígenas “apontam para os passivos ambientais que, por vezes, podem degradar uma área de forma irreversível, tornando certas atividades tradicionais inviáveis, com importantes repercussões para os modos de vida tradicionais. Também demonstram preocupação com a dependência econômica total das comunidades com relação aos empreendimentos”, afirma.

Ao comentar a discussão sobre a possibilidade de legalizar a atividade minerária em terras indígenasdo lado brasileiro, Barros frisa que “o Brasil é um dos poucos países do mundo em que ainda hápovos indígenas em isolamento voluntário, sem contato algum com a sociedade circundante, e que decidiram assim permanecer. O Estado brasileiro tem o dever constitucional de proteger esses povos. A mera perspectiva de abrir os territórios em que estes povos habitam para empreendimentos minerários parece-me aterradora. Não vejo como isso não possa significar outra coisa que não o genocídio destes grupos”. Na avaliação dele, a experiência indígena no Canadá “ajuda apenas em parte”, porque “olhar para o Canadá como um bom modelo da relação entre povos indígenas e mineração deve ser visto com prudência e com análise detida em cada caso concreto”.

Leonardo Barros Soares é psicólogo formado pela Universidade Federal do Ceará – UFC, mestre e doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais. Realizou estágio doutoral em 2017 na Université de Montréal junto ao Centre de recherche sur les politiques et le développement social – CPDS. É membro do Réseau d’études latino-américaines de Montréal – RÉLAM e desenvolve pesquisas na área de democracia participativa, instituições participativas, teoria deliberacionista, política urbana, etnopolítica, política indigenista comparada, povos indígenas americanos, movimentos sociais e associativismo étnico e políticas de reconhecimento territorial indígena.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Desde quando empresas de mineração atuam em terras indígenas no Canadá? Qual é o marco legal que regulamenta esse tipo de atividade e como se chegou a essa decisão?

Leonardo Barros – Antes de mais nada, é importante esclarecer para o público brasileiro que o Canadá é, assim como o Brasil, um dos países com maior demodiversidade do globo, com uma imensa população tradicional composta pelos Inuit, os povos tradicionais do ártico, os chamados Métis, população com ancestralidade mista entre indígenas e colonos europeus e, por fim, as chamadas “Primeiras Nações” (First Nations), povos indígenas da forma como conhecemos o conceito aqui no país. Lá como cá, eles também são o segmento populacional mais subalternizado e empobrecido da sociedade. É importante começar nossa conversa mencionando este fato — que o Canadá tem centenas de povos tradicionais em seu território —, o que é uma surpresa para muita gente.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Desde quando empresas de mineração atuam em terras indígenas no Canadá? Qual é o marco legal que regulamenta esse tipo de atividade e como se chegou a essa decisão?

Leonardo Barros – Antes de mais nada, é importante esclarecer para o público brasileiro que o Canadá é, assim como o Brasil, um dos países com maior demodiversidade do globo, com uma imensa população tradicional composta pelos Inuit, os povos tradicionais do ártico, os chamados Métis, população com ancestralidade mista entre indígenas e colonos europeus e, por fim, as chamadas “Primeiras Nações” (First Nations), povos indígenas da forma como conhecemos o conceito aqui no país. Lá como cá, eles também são o segmento populacional mais subalternizado e empobrecido da sociedade. É importante começar nossa conversa mencionando este fato — que o Canadá tem centenas de povos tradicionais em seu território —, o que é uma surpresa para muita gente.

Brasil e Canadá comungam de uma história de relações ambíguas com seus povos indígenas. Ambos os países buscaram, por métodos diferentes, “integrar” suas populações indígenas ao conjunto da sociedade colonizadora e, ainda hoje, oscilam entre aproximações produtivas e distanciamentos genocidas com suas populações tradicionais.

Dito isso, cabe ressaltar que, assim como o Brasil, o Canadá é um país com forte dependência de commodities extrativistas e com forte atividade minerária em seu território e em outros países, inclusive no Brasil, por meio de empresas tais como a Yamana Gold e a Lundin Mining, para ficarmos em apenas dois exemplos. Como não poderia deixar de ser, estas atividades impactam sobremaneira os povos tradicionais por lá também.

Mineração no Canadá

Não há uma legislação federal sobre a mineração no Canadá e a matéria é largamente regulada pelas províncias, que gozam de maior autonomia que suas contrapartes brasileiras. Assim, diversos tipos de licenças e procedimentos são requeridos a depender da província, do metal a ser explorado e do porte do empreendimento. Em todo caso, há um interesse comum entre governos provinciais e governo federal para a exploração mineral no território canadense, e a atividade conta com gordos subsídios, além de diversas facilitações para que os empreendimentos ocorram.

A maioria dos povos indígenas canadenses só teve maior contato com a mineração a partir da década de 1970, com algumas exceções de povos que convivem com a atividade há gerações. Até aquela época, os povos indígenas canadenses pouco ou nada podiam fazer quando da determinação de um empreendimento minerário em seus territórios. No entanto, a partir de 1975, com a edição do primeiro tratado de reconhecimento territorial indígena moderno, o James Bay and Northern Quebec Agreement, os povos CreesInuit e Naskapi ganharam um maior controle sobre decisões relacionadas à mineração em seus territórios. Esse entendimento foi reforçado em 1978, a partir do relatório Berger recomendando a não instalação do Mackenzie Valley Pipeline sem a consulta prévia aos indígenas afetados. De lá para cá, artigos regulando atividades de mineraçãoforam incluídos em diversos tratados territoriais.

Mineração em terras indígenas canadenses

mineração em terras indígenas canadenses também é limitada por sucessivas decisões da Suprema Corte Canadense, tais como a Haida/Taku ou a recente decisão Ross River Dene Council, da corte de apelação do Território Yukon, que estabelecem a obrigatoriedade de uma consulta esclarecida com os povos indígenas para sua participação na definição da melhor alocação dos recursos naturais presentes em suas terras. Na prática, no entanto, há alguns grupos que se queixam de que os governos provinciais e federal não protegem seus interesses, o que os deixa desamparados frente às propostas feitas pelas grandes empresas de mineração.

Por outro lado, há também lideranças de alguns povos tradicionais que entendem que as companhias estão mais bem posicionadas para avaliar os impactos sobre os povos indígenas e são mais flexíveis em negociações diretas do que os governos. Essa negociação direta entre companhias e povos indígenas é que é a regra por lá.

IHU On-Line – Em artigo recente o senhor disse que existem “modelos bem-sucedidos de parceria entre mineradoras e povos indígenas” no Canadá. Pode nos contar como são feitas essas parcerias, que áreas as mineradoras exploram e por que, na sua avaliação, elas são bem-sucedidas?

Leonardo Barros – Para entender a “parceria” entre mineradoras e povos indígenas por lá, é relevante saber que desde meados do século XIX, após uma forte intervenção do governo nas estruturas tradicionais de organização dos povos indígenas, hoje muitos deles se organizam em “conselhos” que assumem uma forma “quase-municipal” com eleições regulares, estrutura administrativa, assessorias, departamentos, critérios de membresia, jurisdição sobre alguns assuntos etc. Assim sendo, não é de se estranhar que essas estruturas administrativas considerem, muitas vezes, os royalties da mineração como uma importante fonte de renda.

Diante das precárias situações de qualidade de vida experimentadas por muitos povos indígenas canadenses, incluindo altos índices de desemprego, a mineração pode aparecer, no melhor cenário, como uma oportunidade de aumento da renda coletiva e eventualmente da melhoria da infraestrutura comunitária. Além disso, a estratégia de resistência de qualquer grupo social subalternizado pode passar pela ideia de que se a mineração, ou qualquer outro empreendimento de grande porte é inevitável, que ao menos se possa, então, garantir o melhor aproveitamento possível para o grupo atingido.

Quando falo de parcerias bem-sucedidas, me refiro exatamente ao fato de que, diante do empreendimento, povos indígenas politicamente mais organizados e coesos foram hábeis em negociar acordos mais benéficos para si. Estes acordos, chamados de forma geral de “IBAs” (Impact and Benefit AgreementsAcordos de Impacto e Benefício, em tradução livre) ou ainda de “SEPAs” (Socio-economic Participation Agreements, terminologia utilizada pela Aboriginal Mining Corporation e que significa Acordos de Participação Socioeconômica, em tradução livre), contratualizam a relação entre mineradoras e povos indígenas e já passam de cem acordos firmados, hoje em dia, em diversas regiões do país. Os governos provinciais e federal entram como responsáveis fiduciários.

Entre os exemplos mais notáveis está o caso do acordo que deu origem ao reconhecimento do imenso território de Nunavut, que prevê, em seu artigo 26, do IBAs, que “promovam os objetivos culturais Inuit e aumentem seu padrão de vida”. O acordo sobre a mina Raglan, realizado entre os Inuit e a Societé Minière Raglan du Québec Ltée em 1995, também previa a contratação prioritária de Inuits qualificados para trabalhar na mina, o estabelecimento de um comitê para a supervisão contínua do empreendimento, um representante do povo tradicional no conselho de direção da empresa e uma indenização de 60 a 100 milhões de dólares canadenses, mais a distribuição de royalties e de lucros e dividendos. Outro exemplo de sucesso é a parceria entre o Grande Conselho dos Crees e a Goldcorp Inc. em 2011 para o desenvolvimento e operação do chamado Éléonore Gold Project.

Além disso, poderíamos citar a comunidade Moose Cree, na província de Ontário, que se tornou parceira de negócios da Ontario Power Generation na construção de uma hidrelétrica no rio Mattagami. A comunidade de Fort McKay, em Alberta, se beneficiou dos empregos gerados pela exploração do xisto betuminoso na região. Aliás, a indústria da mineração é potencialmente o maior empregador de indígenas por lá. Os exemplos são múltiplos, mas ainda não há uma apreciação de conjunto sobre a questão de forma mais aprofundada. A pesquisa acadêmica sobre o assunto ainda é inicial por lá, ao passo que é virtualmente inexistente por aqui.

IHU On-Line – De outro lado, quais são os conflitos existentes no Canadá entre os povos indígenas e as mineradoras?

Leonardo Barros – Os povos indígenas canadenses têm uma longa história de movimentos de resistência contra governos e corporações, potencializados a partir de 1960 e recentemente reeditados no chamado movimento Idle No More em 2013. Diga-se de passagem, um dos desencadeadores desta que foi uma das maiores mobilizações indígenas em todo o mundo foi, justamente, a proposta de mudança na legislação ambiental e na de águas navegáveis do Canadá, o que beneficiaria enormemente empresas de exploração de recursos naturais em detrimento das formas tradicionais coletivas de gestão dos territórios e das águas indígenas.

A resistência aos projetos de exploração de recursos minerais no Canadá assume várias formas, desde os tradicionais protestos de rua até formas mais complexas, como o recente caso em que os Kw’alaams rejeitaram, por meio de um referendo, um projeto em parceria com a multinacional Petronas para a construção de um terminal de exportação de gás liquefeito na costa noroeste da Colúmbia Britânica no valor de 1,5 bilhão de dólares canadenses.

O repertório de ação coletiva dos grupos é variado, indo desde forte presença midiática até ações mais diretas, tais como bloqueio de estradas ou confronto direto com forças de segurança, passando por lobby organizado sobre parlamentares, marchas e atividades de cunho simbólico, como rodas de dança e cantos tradicionais.

IHU On-Line – Como os indígenas canadenses têm se pronunciado sobre a extração de minério em suas terras? O que dizem os indígenas que são favoráveis a essa prática e os que são contrários?

Leonardo Barros – Não há uma voz unificada dos povos indígenas e demais povos tradicionais sobre esse tema, como também não há, diga-se de passagem, no Brasil. O que há é a organização em associações mais ou menos representativas, tais como a Assembleia das Primeiras Nações (Assembly of First Nations) e os conselhos de líderes de cada povo, variando de região para região. Em resumo, o panorama político é complexo e resiste a uma generalização.

Algumas lideranças dos povos tradicionais que embarcam em parcerias com empreendimentos minerários argumentam que as relações entre as partes não precisam ser, necessariamente, conflituosas, e que um relacionamento mutuamente benéfico pode ser obtido quando da consideração, a sério, do ponto de vista destes povos no desenho e na implementação dos projetos. Estas lideranças, em conjunto com executivos de mineradoras, buscam um acordo de boa-fé que possa, efetivamente, significar a melhoria de vida para as comunidades envolvidas. Historicamente, o governo canadense apresenta fortes déficits de investimento em infraestrutura e geração de renda e emprego nas comunidades indígenas, que observam nas parcerias a possibilidade de virarem o jogo a seu favor.

Os que se pronunciam de forma contrária apontam para os passivos ambientais que, por vezes, podem degradar uma área de forma irreversível, tornando certas atividades tradicionais inviáveis, com importantes repercussões para os modos de vida tradicionais. Também demonstram preocupação com a dependência econômica total das comunidades com relação aos empreendimentos, algo que pode ser visto facilmente aqui, no Brasil, em muitas cidades do interior. Por fim, chamam a atenção para a deficiência do Estado canadense em sua capacidade de fazer cumprir sua legislação ambiental e de direitos humanos em situações de violações destes direitos por parte das mineradoras.